sexta-feira, 20 de julho de 2007

Simples, no fim da tarde

Já haviam andado um bocado, visitando alguns poucos lugares, nem imaginavam o que lhe reservaria o dia seguinte. Mas pra que esperar o dia seguinte pra ver se em algum momento aquele encontro teria compensando? O acaso os levava ao ponto de partida e talvez o mesmo acaso deixaria a tarde cair sem a menor importância. Ambos adoram o silêncio, ainda mais quando carregado de pinceladas significativas de incerteza. Mais uma ou duas esquinas e estaria entregue a menina que pedira informações para chegar em casa. Pobre menina, tímido menino. De tão tímido, imaginava que ela estaria usando tiara, mas não, talvez a timidez e o questionamento do que estariam fazendo ali, bem longe de um mundo que os sufoca, já refletisse em sua mente e corpo, cansados de andar e andar. Avistou o portão anunciado, branco, alto e resolveu ter fome para alongar um pouco mais aquelas palavras, poucas que ainda fossem. Ela aceitou o convite e entraram em uma casa árabe. Porta estreita, corredores longos, um cheiro de quitutes mediterrâneos pairava no local. Ele percebeu que ela ficara um tanto quanto deslocada. "Acho que ela nunca parou em lugar algum para comer assim, de repente e, ainda mais, em pé!", pensou ele. Enfim, convite aceito, ela demonstrou pouca habilidade com o improviso, mas resolveu se sentir a vontade, embora ele não tivesse se convencido. Como bom amante de gastronomias diversas, ele se adiantou e pediu algumas esfihas e, percebendo um certo desconforto na menina que mal sabia apontar qualquer direção quando estava longe de casa, resolveu sugerir algo que fosse leve e pudesse quebrar o gelo entre ela e o balcão. Bem servidos, a moça ainda se mostrava confusa com simples atos de onde colocava as mãos, a bolsa, se relaxava os dedos dos pés ou se abria a boca. "Come com a mão mesmo", sugeriu o menino que apesar da idade já não é tão menino (mas faz questão de guardar molecagens que quebram qualquer gelo). E depois ele sorriu, ela também, timidamente. Ficaram por ali cerca de meia hora, riram de quase tudo, por quase nada. Não apenas mataram a fome, mas definitivamente quebraram o gelo, as cerimonialidades. Ele, conseguiu enfim rir da cara dela sem ser considerado um desalmado. Ela, descobrira que não existe pecado algum em comer com as mãos. Simples, no fim de tarde. Surpresa, no fim de uma rua. Agradável, como algo que começa depois do fim.

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